A PATINHA E A DOBERMAN
Embora Jessie, a nossa Doberman preta de quase quarenta
quilos, tivesse um ar ameaçador — rosnava sempre que via estranhos e atacava
todas as criaturas que aparecessem no pátio das traseiras — era uma cadela
extremamente leal e amorosa connosco. Apesar de querermos ter um outro cão,
achávamos que a Jessie estava melhor sozinha, porque tínhamos medo de que a
inveja a fizesse atacar um qualquer animal que trouxéssemos para casa.
Quando, um dia, o nosso filho Ricky trouxe um ovo da
escola, pressentimos que ia haver sarilho. O ovo tinha a ver com um projeto que
envolvia a incubação e o nascimento de patos. Como não o ovo não abrira na
escola, o professor tinha deixado trazê-lo para casa. O meu marido e eu não
pensávamos que o ovo abrisse fora da incubadora, mas deixámos que o Ricky
ficasse com ele. O nosso filho colocou-o num pedaço de relva ao sol e ficou à
espera.
Na manhã seguinte, acordámos com um guincho bizarro vindo
do pátio das traseiras. Quando fomos ver o que se passava, a Jessie tinha o
focinho colado ao bico de uma patinha cor de pêssego, acabada de nascer.
— A Jessie vai engoli-la viva! — gritei para o meu
marido. — Agarra-a!
Mas o meu marido disse:
— Espera. Dá-lhe tempo. Acho que vai correr tudo bem.
Quando a patinha piou, a Jessie rosnou e fugiu para a
casota. A patinha seguiu-a. A cadela enroscou-se na sua cama, ignorando
ostensivamente a pequena criatura. Contudo, como a pata já a tinha “adotado”
como mãe, enfiou-se na cama dela e aconchegou-se debaixo do seu focinho. A
Jessie bem tentou expulsá-la, mas a pata não se deixou intimidar. Com relutância,
a nossa cadela lá aceitou o seu novo papel, não sem antes dar um grande
suspiro. O nosso filho Ricky deu à patinha o nome de “Pêssego” e rogou-nos que
a adotássemos. Embora a Jessie não mostrasse gostar de ter uma filha, também
não tinha atitudes ameaçadoras para com ela, e, por isso, decidimos ficar com a
patinha e dar tempo ao tempo.
Nas semanas seguintes, e de forma surpreendente, a
Jessie começou a levar a sério o seu papel de mãe. Quando a Pêssego começou a
debicar o chão, a Jessie ensinou-a a escavar. Quando a Pêssego começou a
perseguir bolas de ténis, a “mãe” ensinou-a a apanhá-las. E quando a Jessie se
esparramava no sofá a ver o programa “Planeta Animal”, a Pêssego aconchegava-se
debaixo do focinho dela. Após um ano inteiro de escavações, sonecas, e
apanhadelas de bolas conjuntas, a Pêssego pesava oito quilos e parecia feliz no
seu papel de “cachorrinha” da Jessie. Um dia, porém, a Pêssego deu-se conta de
que era uma pata. Começou a pôr ovos uma vez por dia e tornou-se obcecada por
água. Durante as refeições, enquanto a Jessie comia, a Pêssego chapinhava numa
tina de água.
Certa noite, a Jessie ficou frenética porque a Pêssego
desaparecera. Pensámos que tinha sido algum coiote a levá-la, enquanto a Jessie
dormia. A nossa cadela ladrou e uivou, como o faria qualquer mãe angustiada que
perdesse um filho. Depois de uma busca aturada pela vizinhança, decidimos
desistir. Nessa altura, a Jessie correu para o pátio de um vizinho. Seguimo-la
e vimos a Pêssego a tomar um bela banhoca quente numa banheira. A Jessie saltou
para dentro da casa do vizinho e foi buscá-la. Por muito que quiséssemos
conservar a Pêssego connosco, era óbvio que ela precisava de “abrir as asas” e
de se juntar ao mundo dos patos. O Ricky atou uma fita vermelha à perna da
patinha, colocou “mãe” e “filha” dentro do carro, e fomos até um lago próximo.
Durante a viagem, a Jessie aninhou-se junto da Pêssego e lambeu-lhe a cabeça.
Era como se soubess e exatamente o que ia acontecer e porquê.
Quando chegámos junto do lago, ambas se precipitaram para
junto da água. A Jessie saltou primeiro. A Pêssego seguiu-a, num passo
inseguro. Nadaram juntas durante alguns metros, até a Pêssego tomar a dianteira
e se juntar a um bando de patos. A Jessie voltou para terra e sacudiu a água do
corpo. Sentou-se durante alguns minutos a olhar para a “filha”. Depois, deu um
latido e saltou para dentro do carro, como se dissesse “São horas de deixar a
minha pequenina voar”.
De regresso a casa, o Ricky colou, na casota da Jessie,
fotografias dela e da Pêssego a escavarem, a apanharem bolas e a
aconchegarem-se. Durante muito tempo, após a partida da patinha, a nossa cadela
foi até junto do lago. Víamos a fita vermelha da Pêssego e pensávamos ouvir
também o seu grasnar a dizer-nos “Olá”. A maternidade mudou a Jessie. Outrora
insociável e intimidante, cedo se tornou amiga de todos na vizinhança. Sempre
que podia, ia brincar com os outros cães, e, quando tínhamos visitas, saltava
para lhes lamber a cara. “Rosnar” foi algo que deixou de fazer parte do seu
vocabulário.
No dia em que as tínhamos visto juntas, pela primeira
vez, temeramos o pior. Nunca imaginámos que uma bolinha de pelo amansaria a
nossa enorme Doberman para sempre…
Donna Griswold
______________________________________
Caros Leitores,
Os membros do Clube das Histórias têm vindo, desde há algum tempo, a dedicar-se à recolha e seleção de livros capazes de proporcionar uma reflexão sobre princípios éticos fundamentais para a nossa sociedade. Os temas presentes nesses livros giram em torno de valores como a solidariedade, a coragem, a honestidade, o respeito pela diferença, o sentido de justiça. Valores intemporais, que têm merecido, ao longo do tempo, a atenção de escritores de diversas nacionalidades.
Assim, em simultâneo com o envio das histórias, o Clube teria o maior gosto de colocar gratuitamente à disposição um conjunto de obras integrais divididas em trechos/capítulos, que seriam enviados todas as semanas.
Se estiver interessado(a) em receber semanalmente via email uma obra de leitura extensiva dividida em capítulos, basta responder a este email copiando a seguinte frase no campo do “Assunto”:
“Sim,
estou interessado(a) em participar no projeto: Das Histórias aos Livros.”
O Clube das
Histórias
Sem comentários:
Enviar um comentário